Vivemos rodeados de crises — tecnológicas, ambientais, políticas, emocionais. A modernidade, que prometeu conforto e progresso, trouxe consigo um outro lado: a ansiedade constante, o medo difuso, a sensação de que o mundo avança depressa demais para o conseguirmos acompanhar. Nunca tivemos tanto, e nunca nos sentimos tão pouco.
A crise climática ameaça o planeta; a crise digital ameaça a atenção; a crise política ameaça a confiança; a crise emocional ameaça o sentido. E, no entanto, continuamos — todos — a tentar viver como se tudo estivesse sob controlo. A modernidade ensinou-nos a ser eficientes, mas esqueceu-se de nos ensinar a ser inteiros.
Mas há algo profundamente humano nestas crises: revelam aquilo que ainda nos importa. Se nos inquieta o destino do ambiente, é porque ainda reconhecemos a fragilidade da casa comum. Se nos assusta a inteligência artificial, é porque pressentimos o valor insubstituível do espírito humano. Se nos cansa a política, é porque ainda acreditamos — mesmo secretamente — que o mundo poderia ser melhor.
A esperança não nasce da ausência de problemas, mas da capacidade de olhar para eles com lucidez. E talvez seja esse o maior dom da nossa época: compreender que os desafios são reais, mas também são convites. Convites a repensar, reconstruir, reencontrar o que perdemos enquanto corríamos.
A modernidade está cheia de sombras — mas nenhuma sombra existe sem luz.
E pode bem ser que esta geração, tão cansada e tão desperta, esteja a aprender algo precioso: que o futuro não se herda, constrói-se. E que, mesmo no meio do ruído, ainda é possível escutar o coração do mundo a pedir um recomeço.
© Pedro Miguel Rocha